Os campeões de bole-bole


Jabert Diniz Júnior 

Bole-bole é uma brincadeira que se pratica com cinco objetos similares, como caroços, sementes, pedras arredondadas, ou quaquel outro objeto e que foi muito popular nos anos 1960/70 em todo o País, especialmente nas cidades da Amazônia.

Não se tem a exata certeza de sua origem, e suas regras variam de localidade para localidade. Os nomes também variam. Além de bole-bole, é denominado de: capitão, mão de onça, cinco marias, guru, etc.

O certo é, que, em Alenquer, naqueles tempos, se caracterizava como uma brincadeira quase que exclusivamente feminina. Meninas brincavam de bole-bole, meninos, não. Meninos jogavam bola, brincavam de pião, empinavam papagaio, jogavam peteca (bola de gude). Meninas é que jogavam bole-bole. E o joho tinha uma sequência a ser seguida, ou fases: partia do mais simples para o mais complexo e venciam quase sempre os mais habilidosos,  ou, as mais habilidosas. 

Embora houvesse o preconceito sobre meninos também jogarem bole-bole, vez ou outra, viam-se os moleques numa disputa acirrada. Chegavam a abandonar o futebol, o balador, a peteca e o papagaio só para jogar bole-bole, especialmente quando a disputa esquentava. Sim, verdade, havia disputa e, em 1965, até houve um campeonato de bole-bole que reuniu a nata de "bole-boleiros" do bairro do Centro de Alenquer.

Por conta desse campeonato, dois amigos ximangos ficaram muitos anos sem se falar ("de mal"), porque ambos reivindicavam o título de campeão. Essa birra durou décadas. 

Dizem que esse campeonato foi disputado meio que clandestinamente, justamente por causa do preconceito existente. Muitos não queriam ser vistos jogando bole-bole. Então foi realizado atrás do grupo Fulgêncio Simões e foram usadas neste campeonato pedras feitas de mármore do cemitério Santa Isabel. Pedras caprichosamente torneadas e lixadas especialmente para o campeonato.

Os finalistas, dois moleques que se destacavam em vários esportes, inclusive na brincadeira "do mata" (queimada, em alguns lugares), e que também eram o "terror" da vizinhança (pestinhas), levaram mais de uma hora jogando a última partida. E a molecada, ao redor, assistindo e torcendo. Mas aí, aí apareceu um vigia do grupo e botou a molecada pra correr, o que gerou o impasse de quem teria sido o campeão. 

Hoje, várias décadas se passaram, os dois amigos (que já são avôs),  embora tenham voltado a se falar há bastante tempo, quando se encontram, a discussão, de vez em quando vem à tona: "Fui eu", diz um; o outro repele e diz: Foi tu é o 'baralho'!, Dois velhos quase indo "às vias de fato", por causa de um campeonato de bole-bole ocorrido em julho de 1965.

Um deles, certo dia de discussão, falou: "Fui eu o campeão, rapaz! Quando o Nosval (o vigia do Grupo) apareceu lá, tava na minha vez e eu ia passar na frente!"

O outro rebateu: "Rapaz, o que importa é que quando o jogo foi interrompido, eu tava na frente e,  pelas regras, eu que  fui o campeão!"

Seus amigos, hoje - que naquele dia se dividiam entre os dois competidores, na torcida - na festa de Santo Antônio de 2025, na barraca do Santo (Cliper de Santo Antônio), para por fim à discussão e apaziguar os ânimos entre os dois eternos rivais, resolveram que, naquele ano de 1965, ambos os atletas foram campeões do único torneio conhecido de bole-bole do mundo.

Comentários

Crônicas mais visitadas

VIII Jogos da Ufopa - 6ª Rodada: Uma semifinal e a participação de um jogador profissional

VIII Jogos da Ufopa - 5ª Rodada: noite de Gigantes

VIII Jogos da Ufopa 2025: Uma grande final, muita mandinga e um bicampeão

"Meretríssimo"

"Cul de Cheval"

VIII Jogos da Ufopa: Ser "Bombadinho" nesse campeonato é a moda. Só que não!

O que diria minha avó?

Histórias de Santarém: uma artesã, um homicídio e uma execução.

A emoção de um bom filme

Anjos na Terra