Os carros de boi de Alenquer

Um carro de boi em Alenquer nos dias atuais.
Fonte: Jabert Diniz Júnior


 Por: Jabert Diniz Júnior

Meu filho, corre ali na beira e chama um carreiro pra vir aqui! De preferência, o seu Júlio!”

Ah, quantas vezes, quando era criança, recebi essa ordem da minha mãe, da vó Niquita ou do vô Zé Hage! 

Seu Júlio, eu já conhecia. Todo moleque dali do Centro o conhecia. Seu Júlio, neste caso, era um dono de carro de boi da cidade. Era o carreiro da preferência da minha mãe e dos meus avós.

Carreiros ou carroceiros, assim eram chamados os donos dos carros de boi de Alenquer.

Havia muitos carreiros na cidade naquele tempo. Os carros de boi davam a tônica nas ruas de Alenquer. Nos carros de boi é que eram transportadas as mercadorias que chegavam de barco da cidade vizinha Santarém e de Manaus ou das comunidades próximas. Eram eles, os carros de boi, que transportavam mudanças, materiais de construção, aterros e todos os outros tipos de mercadorias.

E transportavam pessoas também. Até noivas já chegaram à igreja em carros de boi, dizem alguns antigos ximangos.

Seu Júlio, seu Eurico, seu Dalmo, seu Beleza, seu Binga, e tantos outros fizeram desse meio de transporte, seu ganha-pão, sua profissão. Eram os carreiros de Alenquer.

Havia também o seu “Minildes” (Omenídio Nunes Leitão), o lendário carreiro que dava nome dos políticos ximangos aos seus bois.

Seu Minildes, como era chamado, só fui conhecer muitos anos depois, já que, quando eu era criança, ele trabalhava geralmente em outros bairros da cidade.

Sobre o seu Minildes, é possível ler uma deliciosa crônica do amigo Silvan Cardoso, denominado: “O carroceiro que deu nome de político aos bois em Alenquer”, na página https://www.jesocarneiro.com.br/perfil/o-carroceiro-que-deu-nome-de-politico-aos-bois-em-alenquer-por-silvan-cardoso.html.


Seu Minildes, o lendário Carreiro de Alenquer
Fonte: https://www.jesocarneiro.com.br/perfil/o-carroceiro-que-deu-nome-de-politico-aos-bois-em-alenquer-por-silvan-cardoso.html

Já seu Júlio era dos preferidos para fazer “carretos” para meus pais e meus avós. Era também o preferido da molecada do bairro, que se pendurava nas laterais, atrás ou por baixo do carro, quando ele, lentamente, passava pelas ruas. Era o chamado "morcegar". Seu Júlio era um carreiro gentil, não se incomodava com a molecada pegando uma breve carona no seu precioso carro de boi.

Diferente do seu Eurico, que se enfezava e largava a lambada de muxinga nos moleques. E moleque, já viu, né? Dizem que é ajudante do capeta.  Só de pirraça, aí é que a molecada se pendurava por onde conseguisse, no carro de boi do ranzinza carroceiro, só para aperreá-lo.

Seu Júlio era pai do seu Dicão e avô dos meus amigos de infância Zé Júlio e Miguel Ângelo. Morava na subida da serra do Cruzeiro, do lado do hospital Santo Antônio. 

Seu Eurico era tio do amigo Nhango e morava ali pela ilharga da igreja matriz de Santo Antônio.

Naquela época, o carro de boi era o meio de transporte mais numeroso da cidade. Brincávamos nas ruas - que eram quase todas de terra - sem a preocupação de sermos atropelados.

Rua Antônio Mesquita: no passado e nos dias atuais.
Fonte: Jabert Diniz Júnior 

Hoje em dia, ainda há carros de boi em Alenquer, mas não simbolizam mais a cidade. Deram lugar a outros meios de transporte mais "modernos", como: caminhões, caminhonetes, carros e motocicletas. E, no centro da cidade, as crianças já não brincam mais no meio da rua como naqueles tempos.

Lembro que, pelo menos dois carreiros, mantendo sua profissão de transportadores de mercadorias, migraram para as caminhonetes: Seu Beleza e seu Binga.

Seu Júlio, Seu Eurico, seu Minildes, seu Dalmo e tantos outros carreiros, ou carroceiros, sustentaram suas famílias fazendo o transporte de todo o tipo de mercadorias em seus tão estimados carros de boi.

A nós, que éramos os moleques daqueles tempos, vale nos lembrarmos dos carros de boi com uma ponta de saudade dos momentos vividos. 

Muitos ximangos que moram Brasil afora, quando voltam à terra natal a passeio e vê um carro de boi, invariavelmente pede ao seu dono para pegar uma carona e dar uma voltinha e lembrar do tempo de moleque.


** ** ** **

Caríssimo leitor, caso tenha gostado da historinha, já sabe, COMPATILHE com os amigos e, se desejar, deixe seu comentário. Já morcegou um carro de boi? Confessa....


APOIO


Comentários

  1. Muito bom recordar e reviver essas histórias! Parabéns, meu amigo!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Peguei uma carona na sua bela crônica sobre o seu Minildes. Rs...

      Excluir

Postar um comentário

Crônicas mais visitadas

Internacional, o povo de Alenquer te aclama...

Histórias de Santarém: uma artesã, um homicídio e uma execução.

No dia em que saí de casa

VI Jogos dos Servidores da Ufopa 2023

VI Jogos dos Servidores da Ufopa 2023 - FINAIS

Esqueceram de mim?

A Ponte dos Sonhos

O Cagão